terça-feira, 8 de maio de 2007

Viagens na minha terra...




em defesa das ferrovias

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Linha do Douro

I

O conceito dos rios como fronteiras, como espaço "atemporal" entre a vida e a morte (e.g. o rio Lethes) é uma interpretação romana bem distante do conceito dos celtas e gregos para quem os rios são dons da Natureza, energias fluviais que unem os povos, não os separam…
Assim, as diversas tribos galaicas que habitavam o noroeste peninsular, estendiam-se desde o Atlántico aos montes asturianos e do mar Cantábrico à margem esquerda do rio Vouga, e em seguida até à margem direita do rio Côa (Cua dos romanos), um rio que faz um percurso Sul-Norte, fronteira natural entre celtas vettones e os celtiberos lusitanos que seguia depois a margem esquerda do Douro.

O rio Douro nunca foi uma fronteira, mas sim uma artéria de vida entre as comunidades celtas que habitavam as suas margens, daí a importância que para nós representa a linha férrea que serpenteia ao longo do grande rio.

Das linhas ferroviárias nortenhas consideradas secundárias pela "administração central", apenas a do Douro reberá, até 2013, um pequeno investimento no troço entre Porto e Régua, enquanto as de "via estreita" (Tua, Corgo, Tâmega e Vouga) aguardam que "capitalismos disponíveis" as prostituam como destinos turísticos.
Para o governo de Lisboa a prioridade centra-se na chamada "rede de alta velocidade", em detrimento de todas as outras "redes" que seguem submetidas à trilogía "mais degradação - menos utilizadores - maior prejuízo", e consequente abandono!
As empresas de camionagem são cada vez mais omnipresentes, repartindo o bolo entre elas e… muito provavelmente com alguém mais.

Segundo afirmou ao "JN", Júlio Meirinhos, presidente da Região de Turismo do Nordeste Transmontano :
"Um dia virão pessoas que pratiquem uma gestão inteligente, que hão-de-arrepender-se de terem deixado degradar estas linhas".

O presidente da Região de Turismo da Serra do Marão, Armando Miro, nota, porém, que as linhas "não são rentáveis" quando exploradas apenas turisticamente. "Funcionam três ou quatro meses. E depois?". A resposta vem logo a seguir "Ou as linhas são entendidas dentro de uma política global de transportes públicos ferroviários, ou então não vale a pena, pois o prejuízo será muito maior".

II

Construida pela Direcção dos Caminhos de Ferro do Douro (independente até 1927) e inaugurada em 2 de Dezembro de 1887 pela Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, a paisagem ao longo da linha do Douro, desde o Porto, varia entre tonalidades de verde e o colorido das casas das gentes que vivem ao longo do percurso, entre terrenos agricolas e serra bravia.

Logo depois da estação de Caíde, o comboio entra num túnel que rompe as entranhas da terra, mergulhando-nos nas trevas ctónicas durante mais de meio minuto, fazendo-nos apreciar a claridade solar que nos aguarda do outro lado.

O arvoredo, salpicado de hortas que nos indiciam terra fértil, abre-nos um ambiente oxigenado e espaço livre… A recordação da urbe vai-se diluindo com a nostalgia da vida trabalhosa mas relaxante do campo.

Ao fim de uma hora de viagem, ainda falta outro tanto para chegar à Régua, há cada vez menos casas, a paisagem vai ficando mais rural e começa a presentir-se o Douro e as suas encostas que se elevam nas duas margens, repletas de vinhedos.

Ao chegar à Régua fazemos o transbordo para uma composição rebocada por uma locomotiva a vapor, conjunto conhecido como “Comboio Histórico” e iniciamos o percurso de 30 km entre a Régua e Tua.
O trajecto tarda cerca de 2h30 durante os quais a velha locomotora, resfolgando e apitando, queima cerca de 1000 quilos de carvão e 1500 litros de água.
O percurso, agora abandonado, da Linha do Tua (que ligava Tua a Bragança) foi inaugurado a 29 de Setembro de 1887, com a presença de El-Rei Dom Luís e da rainha D. Maria Pia.

Nos confins do Alto Douro, junto à fronteira espanhola, uma velha linha de comboio jaz no fundo dos vales, esquecida e desgastada pela passagem do tempo.
Esta velha linha, onde outrora passavam os comboios que ligavam Porto a Paris, está abandonada desde 1985.
O troço foi construído no final do século XIX, compreende vinte túneis e dez pontes, constituindo uma formidável obra de engenharia.
O percurso entre a estação espanhola de la Fregeneda e a estação portuguesa de Barca d'Alva, numa extensão de 17km, é conhecido por "Rota dos Túneis" (Ruta de los Túneles) e actualmente constitui um interessante percurso pedestre.
É possivel continuar o percurso (andando) ao longo do Rio Douro até ao Pocinho, que actualmente representa o términus da circulação ferroviária da Linha do Douro, passando pelas abandonadas estações de Barca d'Alva, Almendra e Foz Côa.

Em Figueira de Castelo Rodrigo, em 1976 residiam três mil habitantes… hoje resistem 600.

A viagem pela linha do Douro, do Porto até ao Pocinho, parece uma virtualidade com o comboio a circular tranquilamente sobre a água. Visão indescritível de uma paisagem que a mão humana mal tocou!
Porém, a possibilidade de que a linha seja interrompida na Régua é uma ameaça permanente.
Enquanto existe, é a garantia de um passeio inesquecível.

Como pode o Terreiro do Paço ter sensibilidade para se aperceber de quanto tudo isto representa para nós, nortenhos ?!

Devemos ser conscientes de que as vitórias não são prendas, são conquistas !
E a Regionalização será uma conquista… se nós quizermos.
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-> a Linha do Douro foi construída e inaugurada pelo Estado, através da Direcção dos Caminhos de Ferro do Douro (que só passou a fazer parte da Companhia Portuguesa dos Caminhos de Ferro (CP) em 1927, tendo iniciado actividade em 1873.
A abertura ao público do troço entre Ermesinde – Penafiel ocorreu em Julho de 1875.
Posteriormente foram sendo inaugurados troços sucessivos, tendo o comboio chegado a Barca de Alva em 2 de Dezembro de 1887, cocluindo assim a Linha do Douro.
O troço de Barca de Alva até a fronteira fazia parte da exploração da Compañía del Ferrocarril de Salamanca (1871-1928).

3 comentários:

Anónimo disse...

Responsabilidad en el cierre del entonces Ministro socialista Enrique Barón Crespo, hoy Eurodiputado.

Anónimo disse...

interessante
gostei principalmente da primeira parte na qual fiquei a saber para grande surpresa minha que os Galaicos iam até ao Vouga!!! Nunca antes tinha visto algo!!!

Sam disse...

É oq ue tenho defendido em diversos comentários anteriores. Não tenho a certeza de term sido dirigidos a si, mas em tempos cheguei a falar disso em relação à galeguidade da cidade de Gaia, no meu blogue. Que aliás está implícita no nome. Os rios não separam, mas unem. Os romanos é que tinham o hábito de delimitar as fronteiras coincidindo com os rios, por falta de uma divisão natural que desconheciam, de tão vasto que o seu império era.