sábado, 5 de maio de 2007

Viagens na minha terra...

Memórias de Tormes

Viajando no comboio do Douro (1) desde o Porto, após cerca de 1 h 40 mn desembarcamos na estação de Aregos.
Aregos que, por circunstâncias da "A cidade e as Serras" do Eça de Queiroz, também é conhecida como Tormes, está próximo da povoação de Vila Nova, onde se encontra a "Casa de Tormes", a mansão onde residiu o citado escritor.

Desde a estação de Aregos/Tormes decidimos caminhar até à casa de Eça, hoje propriedade da Fundação Eça de Queiroz, um passeio bonito, mas cansativo… cerca de 300 metros sempre, sempre a subir !

O caminho íngreme e alpestre da estação até à quinta é simplesmente maravilhoso.”
Eça de Queiroz in "Carta a Emília de Castro", datada de 28 de Maio de 1892

No alto daquelas serranias estamos num miradouro de beleza sobre o rio, lá no fundo, e até onde a vista alcança contemplamos uma paisagem deslumbrante nas lonjuras d' além Douro, o "Durus" latino, derivado do celta "dwr" ("água").

Aregos (S. Romão de Aregos), que já no século X era nomeada como "villa de Sancti Romano", o "Castro Arecos" dos celtas, é para mim algo mais que a Tormes do Eça pois, aí nasceu António, meu avô paterno, e sua mãe Joana, que ainda conheci.

A casa de Tormes recorda Eça, como a casa de Romarigães" lembra Aquilino e a casa de S. Miguel de Seide relembra Camilo…
Casas com carácter para homens com temperamento. Um apelo ao lar… um grito à tradição !

Mas, as serras não são apenas paisagem… são gente, costumes e formas de ser…
De ser, de sobreviver, viver e conviver.

Serra acima, os contrastes são evidentes. Há lugares onde o tempo se perdeu por caminhos e encruzilhadas e não mais encontrou o rumo. Nas aldeias ainda se amanha o trigo para renovar as coberturas de colmo das casas de granito, mói-se o trigo e o centeio em seculares moinhos de água, assa-se o cabrito e o anho em fornos de lenha e cozem-se as falachas (doces de castanha).
Romarias, festivais de folclore e feiras não faltam nestas paragens. Se os dias são de festejo, expõe-se o artesanato, o barro preto de Fazamões (do outro lado do rio), os cestos de vime ou as toalhas de linho. Canta-se, dança-se, bebe-se e provam-se iguarias.

E uma das formas mais tradicionais de conviver realiza-se habitualmente à mesa, pelo que, seguindo o conselho de Eça, "atacamos" a ementa, acompanhada de um excelente tinto do Douro.

Começamos pelo "caldo de galinha" :
Desconfiado, provou o caldo que era de galinha e rescendia. (…)
Estava precioso: tinha fígado e tinha moela: o seu perfume enternecia: três vezes (…)
in "A Cidade e as Serras"

E, depois desta gastronómica "obertura", passamos lampeiros ao "corpo da sinfonia", um consistente "arroz de favas com chouriço" :
E pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. (…)
Tentou todavia uma garfada tímida (…)
Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado: - óptimo!...
Ah, destas favas, sim! Oh que fava! Que delícia!
in "A Cidade e as Serras"

Um pouco de creme queimado e um sorvo de vinho de Porto completa-nos o repasto !

Após uma barulhenta e bem animada partida de dominó, disputada numa pequena adega, rodeados de pipos e de salpicões pendurados nas travessas do tecto, assistimos a um esplêndido e colorido pôr-do-Sol que, na retina, nos acompanhará no regresso à grande urbe.

O dia terminado, vencendo timidamente o sono e o cansaço que nos invadem, vamos lendo o nome das estações … Mosteirô, Juncal, Marco de Canaveses, Paredes, Ermesinde…
Decididamente envoltos no manto de Morfeu, acreditamos ver, sentado frente a frente, um "peraltado" cavalheiro de grandes bigodes… Eça acompanhava-nos !

A digressão valeu a pena !
Aliás, como diz o poeta, "vale sempre a pena quando a alma não é pequena…" !
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(1) A linha ferroviária do Douro uma notável obra de engenharia que durou 12 anos, concluída em 1887, tem 203 Km de extensão desenvolvendo-se na sua maior parte junto às margens do rio Douro, ligando o Porto ao Pocinho.
Há cerca de 15 anos que o trajecto de Pocinho a Barca d'Alva (28 Km) foi abandonado por razão de rendibilidade, o que não impede que se faça o percurso… andando, junto ao rio, cerca de 8 horas sobre a antiga via ferroviária… somente para "iniciados" na marcha !

9 comentários:

Anónimo disse...

Al leer la "ementa" que nos propone el Sr. Lugano, la boca se me "hace agua" y pienso en el dicho :"Lo sabroso comienza en Vilar Formoso"..........

Anónimo disse...

Olá António,

por favor continua !
http://www.portugalforum.de/politik-kultur-portugal/17354-wandern-spuren-eca-de-queiroz.html#post166028

Foi um ideia boa demais para acabar com este post !
Ralf

Anónimo disse...

Los interventores de trenes y convoys lusitanos no suelen pedirme el billete; su perspicacia fisiognomística descarta que sea, el que suscribe, un polizón.......

Antonio Lugano disse...

Me estoy referiendo a "convoys" celticos... no lusitanos.
Un saludo

Anónimo disse...

¿Habrá hecho el mismo recorrido el Prof. José Hermano Saraiva ?

Antonio Lugano disse...

Muita gente, com gosto, desloca-se a Aregos, uma povoação que Eça imortalizou com "A Cidade e as Serras".
O Prof. Saraiva publicou sobre o tema, em 1996 (creio) um vídeo dirigido aos alunos do "ensino básico". Pessoalmente, a 1ª vez que lá me desloquei (que me deslocaram...) foi em 1944. Tinha 1 ano e fomos (meus pais e eu) visitar a minha bisavó Joana. Sou transmontano por linha paterna e minhoto (Geres) por linha materna.

Anónimo disse...

interessante o texto, gostei

Já agora, curioso o facto de ralf dizer no forum que é originario de Perafita e ao mesmo tempo debaixo do seu nick diz que é Lusitano!!!
Homem, não sabe que Perafita é no Norte de Portugal, ou seja na parte Sul da Galécia? Você é Galaico, não Lusitano.

Quanto ao Espanhol não consigo perceber muito bem o que diz.

Anónimo disse...

Olá Anómino,

concordo plenamente.
Informei o Forum , que me distancio expressamente -também em nome dos meus vizinhos e demais Perafitenses- dos "Lusitanos" e insisto que me tratem como "Galaico".
A verdade historica não permite enganos.
abraço
Ralf

Anónimo disse...

Fico contente por saber que assume e tem orgulho na sua identidade.

A maioria das pessoas com quem tenho contactado depois de ficar a saber do assunto, reage mal.
Uns continuam a insistir que são Lusitanos e não são Galaicos e que isto dos Galaicos são mentiras e invenções, outros dizem que apesar de serem Galaicos querem assumir-se como Lusitanos, enfim, uma vergonha.

O que é uma vergonha também é o que o estado Português faz connosco. Nós do Norte nem sabemos as nossas origens, pensamos que somos Lusitanos, enfim..
Ralf, bem-vindo ao pequeno clube de Galaicos que sabem que são Galaicos.

Saudações Galaicas para a Alemanha que é um belo país com um rico nivel de vida (ao contrario do nosso Norte de Portugal, que por ser uma autentica colonia de Lisboa esta cada vez mais pobre e com pior poder de compra)

A nossa nação é Galiza e Galécia Sul (Norte de Portugal)