sexta-feira, 27 de abril de 2007

O mito de Alfonso Anriques





2. Curiosidade e História
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Perante a curiosidade de tantos, de imediato surgem os ínclitos "historiadores de turno" jurando que não existe nenhuma dúvida e que a curiosidade manifestada é "uma concupiscência", tal como afirmava Blaise Pascal, um vicio moral, como referiram Alighieri Dante e Francesco Petrarca.
Porém, diz um provérbio que "quem teme a curiosidade dos outros… algo tem a esconder" !

Consideraros a curiosidade como uma sensibilidade orientada a compreender, como um impulso decisivo que abre a via do conhecimento racional, como defendiam Galileo Galilei, Giordano Bruno e Francis Bacon.
Tratemos pois, a curiosidade como uma capacidade de formular dúvidas, um meio para buscar a possivel tranquilidade, a necessária "eudaimonia" que resulta da supressão de uma suspensão de parecer (dúvida).
"A curiosidade, filha da ignorância, é mãe da ciência", afirmava Giambattista Vico, filosofo precursor da Filosofia da História, em "Scienza nuova", publicado em 1725.

Quando subsistem dúvidas, rever a História é certificar-se de que nos revelam a verdade ou, se nos mentem, qual o propósito !

Reflectir, ponderar, sobre o sentido e a finalidade do devir histórico é a finalidade da Filosofia da História, em cujo âmbito, uns negam toda a ideia de finalidade afirmando que a História é fruto do acaso e do imprevisto, enquanto outros afirmam o contrário insistindo na sua característica teleológica.
Uma terceira via, considera um absurdo incluir a História num "absoluto imprevisto", assim como o de a considerar uma "função determinista". Consideramos, permito incluir-me, que tal como na biologia estamos perante um processo de "acaso e necessidade" mas, diferentemente da biologia, o "acaso" pode sofrer, circunstancialmente, influencias "determinantes" introduzidas por actividade humana consciente.
Considerando que o propósito da ciência é de subordinar os factos a principios ou de os deduzir destes, Arthur Schopenhauer negava não só a cientificidade da História, mas igualmente o principio de um "devir" (determinante) histórico.
Dizia Schopenhauer (in "O mundo como vontade e como representação", suplemento ao livro III, capitulo XXXVIII) :
"A divisa da História deveria ser "Eadem, sed aliter", ou seja, "as mesmas coisas, mas de outra maneira". …

O género histórico pretende definir-se pela sua finalidade, o relato de acontecimentos passados. Mas, há relatos e relatos.
Juntamente com a História existe a lenda, como narração criadora de heróis a partir do homem histórico, e o mito, evocador de mistérios originais e de poderes da natureza, descritos numa linguagem imaginada e simbólica.
O conto, a lenda e o mito têm uma função de ensino. A História também ! Porém, o que faz a especificidade da História é que ela pretende cingir-se aos factos, citar os acontecimentos humanos.
Heródoto de Halicarnasso, um dos primeiros historiadores gregos, justificava a sua acção "para impedir que os actos cometidos pelos homens fossem apagados pelo tempo".

O vocábulo grego "istoria" significava inquérito, não relato ou narração, porém, a partir da Idade Média, com o fervor de transmitir verdades, transformou-se em "interpretação" tendenciosa, ideológica e catequética.
A vocação primária da História em construir uma memória inalterável e de garantir una perenidade ao passado foi assumindo funções de catecismo dirigido à formação (deformação) das mentes, e predestinando-se como função manipuladora.

Assim que, a História não passa de uma interpretação de acontecimentos conhecidos, de uma representação ideológica de encadeamentos mais ou menos forjados para constituir um conjunto minimamente coerente.
Analizemos, e.g., a batalha de Waterloo (18 de Junho de 1815).Tudo é confusão nesta história.
Denomina-se "batalha de Waterloo" por imposição dos vencedores, ingleses, pois essa batalha não se realizou no sitio de Waterloo, mas sim no sopé do "Mont-Saint-Jean Mont", e por esse nome é conhecida pelos franceses, sendo designada pelos alemães como batalha da "Belle-Alliance" (nome da propriedade rural que incluia o que foi o campo de luta).

Três denominações diferentes para uma mesma batalha mas, como é habitual na História "oficial", é a versão dos vencedores que se impõe.

Uma emissão televisiva da BBC, cuja pretenção era explicar a "batalha de Waterloo", é elogiada a eficacidade dos ingleses sem citar as restantes tropas da Coligação, nem mesmo os prusianos a quem, segundo fontes militares, devem a consolidação da vitória.
Mas, a confusão não fica por aqui, e a perplexidade vai em aumento quando constatamos que a versão de "magnífica vitória da capacidade militar", cantada pelos ingleses vencedores, é confrontada com testemunhos que não hesitam em acusar o marechal francês "Marquis de Grouchy" de indecente traição.
Na prisão degredo da ilha de Santa Helena, Napoleão escreveu ; "O marechal Grouchy, com 34 000 homens e 108 peças de artilharia, conseguiu o segredo de, na jornada do 18 de Junho, não ser visto no campo de batalha do "Mont-Saint-Jean" …
Em Julho de 1815 Grouchy refugia-se nos Estados Unidos, onde residirá cinco anos.

Porém, Waterloo não é caso único !
Sobre a origem do cristianismo ou a revolução francesa de 1789, a "invasão" àrabe à Europa no século IX ou as guerras de 1914/1918 e 1939/1945, o que nos contam são versões políticas dos vencedores, sendo as omissões e interpretações "politicamente correctas" dos historiadores "oficiais" em grande parte devidas à sua deficiente actividade de pesquiza, e à consequente aceitação de modelos reprodutores de lendas consideradas fundacionais.

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3. Origem de Portugal

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